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EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA É VIÁVEL?

  • Foto do escritor: Eliete Carvalho
    Eliete Carvalho
  • 6 de mai. de 2020
  • 4 min de leitura

Sou professora e conheço bem a realidade de alunos de escolas públicas. Eu ensino em uma. Já visitei bairros periféricos e casas de alunos. Casas, muitas vezes, que são barracos sem estrutura e espaço adequados. A escola pouco sabe sobre as condições de vida, interesses, desinteresses, sonhos e ocupações de seus estudantes. Ela desconhece suas reais necessidades e as desigualdades que afetam, certamente, o desempenho dos alunos nos estudos. Alunos pobres e de periferia, muitos deles com pais semianalfabetos, analfabetos e desempregados, aparecem em estatísticas como os brasileiros que menos têm acesso a computadores, internet e celulares. Engano é pensar que todos os alunos estão conectados. Não quando se trata dos menos favorecidos.



A desigualdade existe. Todo mundo sabe, e ela está estampada, nua e crua nas capas de jornais e bem pertinho da gente, porém muitos governos preferem fechar os olhos para ela. Tratar a Educação como se todos possuíssem as mesmas oportunidades e condições de acesso às tecnologias, é, sobretudo, desconsiderar que, em tempo de pandemia, muitos alunos sequer têm o que comer, agora, imagine ter internet para estudar em casa. Oferecer Educação a Distância, com a prerrogativa de que “a educação não pode parar”. É de uma natureza excludente, pois, se mais da metade da população estudantil de escolas públicas não têm acesso às mídias, como atingir o objetivo com essas aulas não presenciais? É justo que esses alunos fiquem de fora do processo? E como ficam aqueles alunos deficientes que precisam de recursos e acompanhamento específicos? Como ficam os alunos da Educação Infantil? E os alunos que estão no processo de alfabetização? E os estudantes idosos da Educação de Jovens e Adultos? São lacunas que merecem respostas nas aulas de EAD.


Fico a imaginar que as orientações da BNCC foram totalmente colocadas em segundo plano. O critério de igualdade e equidade tão bem colocado, nos textos do documento, caiu por terra quando se trata das tais EAD improvisadas. Sem falar que os alunos recebem as aulas de forma passiva. Apenas, reproduzem o que os professores orientam, sem interação devida, sem feedback, sem contato presencial, sem afeto e sem socialização com outros grupos. Certamente, esse modelo está muito distante do que preconiza a BNCC. E as metodologias de ensino? Não restam dúvidas de que, com as aulas da EAD, o professor passou a “transferir conhecimento”, simplesmente. As aulas são ministradas como se “todos”, eu disse todos aprendessem em tempo real e do mesmo jeito. O foco dos estudos não é com o aprendizado dos alunos, e sim, com os conteúdos. Eles precisam ser dados, dizem os gestores. Assim, ocorrem com as orientações de GREs e Secretarias de Educação de todo o país. E os professores, de uma hora para outra, viraram youtubers sem as mínimas condições de trabalho, formação continuada e apoio pedagógico e tecnológico. Muitos professores estão fazendo as aulas de suas casas com os seus próprios recursos, pois muitas secretarias de educação, sequer, disponibilizaram as plataformas digitais em seus sites ou aplicativos, mas, por outro lado, exigiram dos professores as tais aulas multimídias.


Já existem muitos relatos de professores expondo as dificuldades e as precariedades na qualidade desse improvisado ensino à distância, tais como:

  • Nem todos os professores como também os alunos sabem usar corretamente os recursos tecnológicos como: câmera, vídeo, aplicativos, entre outros;

  • Os professores passaram a trabalhar mais com o ensino a distância, e estão disponíveis para os alunos 24h, sendo incomodados a qualquer hora para tirar dúvidas de alunos e de pais;

  • Os professores reclamam que nem todos os alunos entram no horário programado, o que dificulta as orientações do estudo; sem falar das quedas de sinal de internet;

  • O ensino a distância requer, além de planejamento, hora marcada, acompanhamento dos pais nas atividades, autonomia, concentração e disciplina dos alunos, mas, em muitos lares, os pais não acompanham e muitos não sabem ler e escrever, e muito menos sabem usar as tecnologias da internet;

  • Os professores relatam ainda que não têm como acompanhar o desenvolvimento da aprendizagem dos estudantes via transmissão à distância, pois, para isso, necessitaria do contato presencial; além de ficarem sobrecarregados com as demandas de outras Redes de ensino;

  • Com os acontecimentos da pandemia COVID-19 e o isolamento social, muitos professores já se encontram inseguros, ansiosos e até depressivos, pois, também, tiveram que se dividir entre as aulas à distância, os afazeres da casa e o acompanhamento dos filhos; além das pressões dos gestores de GREs e Secretarias de Educação;

  • Não são todos os professores convocados para fazer as aulas da EAD, nas plataformas dos governos, apenas os selecionados. E como ficam os demais professores alijados do processo?


Existe uma Campanha Nacional pelo Direito à Educação alertando que, embora existam dispositivos legais para a oferta de EAD, ela é considerada “complementar” e “emergencial” no Ensino Fundamental. Já, na Educação Infantil, ela é inviável e ilegal. É bom que se diga aqui que ninguém é contra a EAD e nem o uso de suas tecnologias. Pelo contrário, ela está a favor da educação, da escola, da pesquisa e do conhecimento. O que se questiona, nesse momento, é que os governos, de forma precipitadas e concentradoras imponham um novo modelo de educação a distância, ignorando que 42% das casas, segundo levantamento da Rede Brasil Atual, de alunos de escolas públicas não possuam computadores ou internet. As escolas também não têm tais equipamentos. O que agrava mais ainda as precariedades do ensino.


Portanto, a obrigatoriedade das aulas, em substituição aos dias letivos, está deixando de fora, principalmente, os mais necessitados. O que vem contribuir, ainda que momentaneamente, para ampliar as desigualdades sociais e a exclusão de acesso às tecnologias e, por consequência, ao ensino e à aprendizagem. Lugar de professor e de aluno é na escola. “A escola é insubstituível e a educação é essencialmente um processo dialógico. Nada substitui a relação entre os professores e seus alunos. Dessa interação, e também do relacionamento entre os próprios estudantes em sala de aula e nos demais espaços escolares, é que se processa a aprendizagem e se produz o conhecimento”, disse Bebel, presidenta da APEOESP.


Eliete Carvalho ____Blog Letras & Livros

Palmares, 06 de maio de 2020

Imagem: Google

1 Comment


Josenildo Barros
Josenildo Barros
May 06, 2020

PARABÉNS PELO TEXTO ELABORADO E DENTRO DA NOSSA REALIDADE...SOU SEU FÃ!

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